Revista Brasileira de Avaliação
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Revista Brasileira de Avaliação
Resenha

“+Avaliação -Desigualdade”: Um olhar transversal para o contexto avaliativo

Umberto Proietti Neto

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Resumo

Introdução Avaliação e monitoramento são práticas fundamentais para a gestão do investimento social público e privado. Como todas as esferas da vida social, estão sujeitas à forças políticas, socioeconômicas, culturais que atravessam as relações entre indivíduos, comunidades, organizações e instituições. Esse é um dos pontos de partida da publicação “+Avaliação – Desigualdade”, concebida na parceria entre a Rede Brasileira de Monitoramento e Avaliação (RBMA) e a Agenda de Avaliação do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) em 2021, e publicada em 2022 (Matheus, 2022). A publicação se destina a toda a comunidade que interage com processos avaliativos, organizações contratantes e consumidoras de avaliações, avaliadores independentes, também àqueles que em geral são considerados o “público-alvo” das avaliações. A metodologia foi pautada na construção coletiva: primeiramente na revisão e mapeamento da literatura que abordasse a intersecção entre os temas avaliação-desigualdades-investimento social privado, em seguida foram entrevistadas 20 pessoas com diferentes trajetórias e recortes sociodemográficos vinculadas ao meio avaliativo, e em terceiro lugar houve a promoção de rodas de conversa com ainda mais pessoas do meio para apresentar os processos e resultados dos passos anteriores e abrir para debate em mais uma instância para consolidar oito diretrizes aglutinadas em quatro pares. A publicação Nas palavras de Cesaire (1955), “[...] uma civilização que se revela incapaz de resolver os problemas que seu próprio funcionamento suscita, é uma civilização decadente”. As desigualdades são um desses problemas e são, nos ternos da publicação: eticamente inaceitáveis, politicamente instáveis, socialmente vulneráveis, coletivamente insuportáveis. “+Avaliação -Desigualdade” nos instiga a pensar a avalição através dessa perspectiva. A existência de desigualdades socioeconômicas como fenômeno social é ponto pacífico, do senso comum ao meio acadêmico, embora suas raízes e soluções sejam alvo de debates que perduram por séculos, e sejam, há tempos, objetos de políticas públicas e projetos de investimento social privado. Contudo nos deparamos em “+Avaliação -Desigualdade” com um olhar para todas as assimetrias que de forma interseccional atravessam a constituição dos sujeitos. Assimetrias não apenas de acessos a recursos materiais entre as partes envolvidas nos programas e projetos e suas avaliações, mas também epistemológica, simbólica e cosmológica que permeiam a valoração dos corpos, a validação de discursos, os lados da linha abissal A RBAVAL apoia os esforços relativos à visibilidade dos autores negros na produção científica. Assim, nossas publicações solicitam a autodeclaração de cor/etnia dos autores dos textos para tornar visível tal informação nos artigos. Recebido: Abril 04, 2023 Aceito: Abril 16, 2023 *Autor correspondente: Umberto Proietti Neto E-mail: umberto.proietti@yahoo.com Revista Brasileira de Avaliação, 12(1), e120623, 2023 2/3 “+Avaliação -Desigualdade”: um olhar transversal para o contexto avaliativo (Santos, 2007) no qual se encontram cada um dos agentes envolvidos no processo avaliativo, em relação aos seus recortes sociodemográficos e identitários. Tendo em vista a proporção continental do território brasileiro, a complexidade e diversidade dos desafios de gerar impactos sociais positivos, “+Avaliação -Desigualdade” pensa o processo avaliativo como um exercício, uma ferramenta, cujo potencial para contribuir com o processo de redução ou eliminação das desigualdades se dá na construção de conhecimento sobre os desafios locais e globais, no mapeamento e dimensionamento de assimetrias, na compreensão dos impactos de cada projeto e na diversificação dos agentes que interagem com o processo avaliativo. Para isso construíram oito diretrizes, agrupadas em quatro pares que são condições para potencializar essa ferramenta. São diretrizes reflexivas e dialógicas que almejam antes expandir horizontes do que criar axiomas ou leis, mesmo assim possuem parâmetros bem definidos e métodos de implementação propositivos. O primeiro par de diretrizes é democrática e transparente. Democrática pela assunção e reconhecimento de que as relações postas são políticas, implicando em agentes de interesses distintos e em posições assimétricas, ativamente, equalizando o processo, de modo a elevar e engajar as vozes que tendem a ser silenciadas. Transparência implica na publicização reiterada de dados, métodos, recursos e processos que permitam a responsabilização de agentes e agências, rastreabilidade e revisão de processos e métodos, numa linguagem acessível a todos os envolvidos, condição fundamental também para a democratização do processo avaliativo. Intercultural e inter-identitária instigam considerar a multiplicidade de cosmovisões das comunidades afetadas no processo avaliativo. É importante para potencializar a observância de necessidades locais a validação de perspectivas das comunidades, que nem sempre tem acesso ao conhecimento técnico ou acadêmico, como sujeitos de saberes ao invés de objetos do conhecimento. Escuta ativa, reflexividade, curiosidade e inclusão da comunidade no processo avaliativo são fundamentais para integrar pessoas com diferentes trajetórias, arcabouços culturais e recortes de gênero, raça/cor, etnia, identidade, etc. Interdisciplinar e multi-saberes, trata da importância do questionamento dos princípios que regem a produção e validação do conhecimento e a assimetria entre as disciplinas acadêmicas e saberes tradicionais. É ressaltada a necessidade de abarcar paradigmas epistemológicos que permitam visões holísticas e sistêmicas do conhecimento, incluindo tanto os saberes empíricos de comunidades como a lógica do conhecimento nos paradigmas acadêmicos. É proposto um escopo transdisciplinar na avaliação, agregando profissionais com diferentes arcabouços teóricos que permita a coexistência metodológica na condução dos processos avaliativos. Pedagógica e reformadora demonstra a necessidade de o processo avaliativo se retroalimentar, com vistas a processos continuados de formação e conscientização das populações avaliadas que, por sua vez, formam e conscientizam os outros agentes da avaliação, de modo a tornar o processo mútuo e dialógico. Processo que também se abra à autocrítica, pensa o destino da avaliação e a quem ela serve, bem como se a formulação das perguntas que movem a avaliação tem solidez o bastante para tornar o processo de fato transformador. É possível pensarmos “+Avaliação -Desigualdade” como um dos pontos de partida para se pensar a avaliação pelas perspectivas ética e política que, por sua vez, promovem um conjunto de práticas que se demonstram coadunadas com demandas de parcelas da sociedade. Parte dela, posta nos lados desfavorecidos das relações desde o período colonial, com a pilhagem sistemática, material e simbólica, de sociedades que hoje compõem o Sul Global. Ignorar tais perspectivas que almejam a simetria, pode descredibilizar processos potentes para a construção de equidade nos contextos avaliativos e ainda perpetuar um conjunto de práticas que reforçam as desigualdades.

Referências

Cesaire, Aimé. (1955). Discourse on colonialism. New York: Monthly Review Press.

Matheus, Wesley (Ed.). (2022). Mais avaliação e menos desigualdades. Rio de Janeiro: Grupo de Institutos, Fundações e Empresas. Recuperado em 4 de abril de 2023, de https://sinapse.gife.org.br/download/ mais-avaliacao-e-menos-desigualdades

Santos, Boaventura de Sousa. (2007). Para além do Pensamento Abissal: Das linhas globais a uma ecologia de saberes. Revista Critica de Ciencias Sociais, 78(78), 3-46. http://dx.doi.org/10.4000/rccs.753


Submetido em:
04/04/2023

Aceito em:
16/04/2023

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