Revista Ação Ergonômica
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Revista Ação Ergonômica
Editorial

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Mario Cesar Vidal

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Ergonomia e Organização do TrabalhoNa histórica reunião do conselho da International Ergonomics Association em San Diego, USA, foi aprovada a definição internacional de Ergonomia que estabelece, entre outros, o campo de uma ergonomia organizacional. O tema que já há muito acendia paixões e gerava imensas polêmicas em todo o mundo, não chega a surpreender os ergonomistas brasileiros, já que uma boa parte deles sempre teve dificuldade de fazer como nossos colegas de outros países, cuja separação antre os aspectos fisicos, cognitivos e organizacionais relacionados ao trabalho não parecia ser problemática. È certo, como eu mesmo já escrevi em outra oportunidade (Vidal, 1997), que ao se falar de trabalho e organização deve-se distinguir o plano da organização geral da organização do trabalho. A organização geral tem como bases teóricas a “teoria das organizações” e a “logística”, buscando especificar a organização produtiva tal como um organismo com vistas à sua atuação no contexto mais geral: social, econômico, geográfico, cultural. Em termos de uma visão restrita a negócios, busca-se estabelecer como este organismo se estrutura para funcionar neste espaço de inter-relações através dos conceitos de contingências e de poder, e das apreciações críticas entre ambos. A idéia motriz é a de estratégia e os conceitos subsidiários são os de criação (concepção, projeto e especificação), mobilização (deslocamentos, alocações e atribuições) e sustentação (apoio, manutenção e regulação). Enfim, tenta-se aqui compreender as formas pelas quais os grupos e sociedades possam se propor objetivos e habilitarem-se a receber as sanções (positivas e negativas do ambiente onde evoluem). Trata-se de entender o organismo do ponto de vista de suas intenções e suas homeostases com o meio. A meu ver, é dentro desta ótica que se pode entender a questão dos programas de qualidade e, mesmo do debate da globalização da economia versus autonomia nacional. A organização do trabalho, se prosseguirmos na metáfora biológica, trata dos aparelhos funcionais internos de uma organização produtiva e que lhe dão sentido motor. Em termos concretos o plano é o da troca de energia entre as pessoas da organização, repartidas entre as energias de execução e de controle, ou antes, de como estruturam-se os aparelhos para manusear tais energias. A idéia motriz é a de compreender como se dão as formas a cada uma das unidades funcionais, as disposições (físicas, mentais e sociais) necessárias para a consecução das funções que lhes são imputadas pela organização geral e o conceito subsidiário que é o estabelecimento de métodos de trabalho. Com uma história da organização do trabalho ainda por escrever, muitos autores confundem, até com certa razão, estes dois planos. A organização do trabalho nessa perspectiva subentende uma engenharia do trabalho, entendida como o estudo e implementação de novos meios para resolver problemas colocados pela organização do trabalho. Tal como na teoria das organizações, vemos uma miríade de variantes do modelo burocrático de Weber (1947) às abordagens em organização do trabalho, hoje, sintetizadas em duas vertentes, quais sejam, a Administração Científica do Trabalho (Taylor, 1911) e a Concepção Sociotécnica (Trist e Bamworth, 1951, Trist 1981). O problema - ou dilema - cotidiano do ergonomista no chão-de-fábrica é, a meu ver, fazer com que o sistema de trabalho funcione e tenha resultados crescentes em termos de desempenho - quantidade e qualidade da produção -, e qualidade de vida - saúde do trabalhador e segurança do trabalho (Vidal, 1993). Seu problema - ou dilema- está diretamente afeito à organização do trabalho e indiretamente à organização geral. Diremos, para acertar a terminologia, que a organização do trabalho determina a atividade das pessoas, conquanto a organização geral lida com suas contingências. Para que tenhamos claro nosso objeto de discussão estabeleçamos que a organização do trabalho cuide de, ao menos, seis aspectos interdependentes: i) A repartição de tarefas no tempo (estrutura temporal, horários, cadencias de produção) e no espaço ( arranjo físico); ii) Os sistemas de comunicação, cooperação e interligação entre atividades, ações e operações; iii) As formas de estabelecimento de rotinas e procedimentos de produção; v) A formulação e negociação de exigências e padrões de desempenho produtivo, aí incluídos os sistemas de supervisão e controle; v) Os mecanismos de recrutamento e seleção de pessoas para o trabalho; vi) Os métodos de formação, capacitação e treinamento para o trabalho; Se assim considerarmos, vamos de encontro ao enunciado proferido por um de nossos colegas (Valle, 2002), segundo quem o século XX é um século não apenas de transformações e inovações técnológicas, mas igualmente um século de grandes propostas e inovações no campo da organização do trabalho. Realmente, os fatos ali estão para corroborar esta afirmativa forte: a organização “científica” de Taylor, a linha de montagem de Ford, o experimento de Hatworn, a sociotécnica do Tavistock, os grupos semi-autônomos, o toyotismo e o ohnismo vindos do Japão junto com os kan-ban e os just- in-time,. E as novas formas de trabalho remoto possibilitada pelo avanço da tele- informática. Profissões inteiras do ramo gráfico desparecem, transmutam-se como nos assinala Carvão (2002). As formas contratuais ou se precarizam ou assumem contornos complicados como o cooperativismo profissional. O campo da ergonomia naturalmente não poderia ficar infenso a todo este movimento. Na compreensão mais contemporânea da ergonomia, especialmente se falarmos de macroergonomia e de antropotecnologia, lá está a questão da organização do trabalho em seu cerne. Se voltarmo-nos para as regulamentações, pode-se observar o lugar de destaque que ocupa a OT na norma regulamentadora 17. A redação atual deste regulamento técnico abre uma possibilidade até então inexistente, a de que o Estado, através de seu aparelho fiscal possa questionar junto ao empregador a forma e a possibilidade de organizar o trabalho, um importante fundamento da reconstituição social, no falar do importante filósofo Hans Freyer. E se formos nos posicionar face ao imenso campo normativo, visitar o mundo das ISO e dos prêmios de qualidade, lá aparece a ergonomia como componete de sitemas de gestão. Pedra de cal sobre quaisquer dúvidas acerca da pertinência das questões organizacionais ao campo de interesse e da ação ergonômica, as demandas mais crecentes em todo o mundo não tratam de ergonomia localizada ou de intervencções sungulares, mas de Programas de Ergonomia e de suas inserção na estratégia das empresas e nos seus valores de responsabilidade social. Ação Ergonômica, para acompanhar tais fatos de sociedade, organiza este número especial. Iniciamos com um guia de auto-orgnização para aqueles que pretendam publicar em Ação Ergonômica. Trata-se de uma orientação de publicação fundamentada nos principais ditames de revistas internacionais e em padrões de excelência como os da APA e das editoras Taylor and Francis, Lawrence Earlbaum e Elsevier, as principais editoras científicas do mundo. Em seguida, passamos para o teor do tema, trazendo uma reflexão sobre ergonomia e organização realizada por nosso colega chileno em uma situação extrema, a organização de brigadas florestais contra incêndio. Prosseguindo, abrimos a linha da revista para contribuições ampliadas sobre o campo da organização do trabalho. Neste sentido, Betiol e Tonelli nos aportam uma reflexão psicodinâmica sobre as questões do absenteismo e comprometimento. As contribuições de ergonomistas formam o âmago deste exemplar trazendo em primeiro lugar. a dinâmica coletiva do trabalho na indústria da inteligência, a produção de softwares, analisada por Echternacht e Castro, ergonomistas da UFMG. A esse estudo seguem-se dois trabalhos produzidos na UFRJ, UFF e FIOCRUZ. O primeiro deles tratando dos limites da abordagem AET para o encaminhamento de riscos biomecânicos, o segundo tratando da situação complexa do atendimento pré-hospitalar em via pública. Encerrando este exemplar, e ligando-se com o último dos artigos acima, Petzhold, membro honorário da ABERGO, apresenta suas considerações macro- ergonômicas sobre segurança de trânsito, situando-se na fronteira da organização do trabalho e das políticas públicas para este problema, responsável por mais de 70% dos acidentes mortais, os acidentes de trajeto. Ação Ergonômica inaugura não apenas uma nova conformação em direção à segurança do trabalho e ao campo da psicodinâmica do trabalho, como também passa a acrescentar notas técnicas, comunicações e resumos de tese, de forma a configurar-se como o principal veículo científico da ergonomia latino-americana. Este nosso sonho depende apenas da contribuição dos autores, com a submissão de seus artigos e principalmente da contribuição de nossos leitores com criticas e sugestões para a melhoria contínua da revista.

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