Réplica Raquianestesia com a mistura enantiomérica de bupivacaína a 0,5% isobárica (S75-R25) em crianças com idades de 1 a 5 anos para cirurgia ambulatorial
Luiz Eduardo Imbelloni ; Eneida Maria Vieira ; Lúcia Beato ; Francine Sberni
Resumo
Senhor Editor,
Agradecemos os comentários de Silva Junior, um dos mais importantes anestesiologistas pediátricos do Brasil, sobre o nosso trabalho 1. O primeiro relato de raquianestesia em crianças foi, na realidade, de August Bier, em 1899 2, quando a realizou em um menino de 11 anos, utilizando a cocaína isobárica como anestésico. Em 1900, Bainbridge 3 publicou 40 cirurgias com raquianestesia, incluindo uma criança com menos de três meses de idade. Só em 1909, Tyrell Gray 4 publicou o resultado de 300 anestesias espinhais em crianças para procedimentos abaixo do diafragma. Vários outros autores relataram o uso da raquianestesia em 1933 5, 1936 6 e 1951 7. Com a introdução dos curares (1944) na prática anestesiológica e o aparecimento de agentes inalatórios mais modernos, como o halotano em 1956, diminuiu o uso da raquianestesia. Por não querermos ser desterrados em nossa terra, preferimos citar autores nacionais quando eles existem, além de serem trabalhos conceituados 8,9.
A raquianestesia para crianças jamais ganhou popularidade no mundo, até que em 1984 foi reintroduzida como alternativa da anestesia geral para recém-natos de alto risco 10-12 e se tornou popular para todas as crianças. Nos recém-natos a raquianestesia foi sugerida por diminuir a incidência de complicações, incluindo apnéia e disfunção respiratória no pós-operatório 13. A anestesia regional diminui a resposta ao estresse cirúrgico durante e após cirurgia, assim como a morbi-mortalidade em pacientes adultos de cirurgias não cardíacas 14. Os mesmos benefícios foram observados em pacientes pediátricos submetidos à cirurgia cardíaca 15. A raquianestesia proporciona maior segurança, observando-se menos dessaturação e menor incidência de apnéia 11,16-18, sendo também indicada em crianças com asma grave, com problemas para intubação traqueal (traqueomalácia, síndrome de Pierre-Robin, artrogripose múltipla congênita, macroglossias etc) e fechamento de ductus arterial. O uso de cateteres no espaço subaracnóideo foi também recentemente proposto 19. Como se pode apreciar, as indicações têm sido ampliadas durante todo o tempo e, como a anestesia ambulatorial é o grande objetivo do futuro, as indicações foram maiores que na literatura estrangeira. Esses fatos justificam o novo interesse pela técnica, principalmente quando se tem como objetivo estudar uma droga ainda não utilizada em crianças, a mistura enantiomérica (S75:R25) de bupivacaína 0,5% isobárica.
Concordamos com Silva Junior que o comportamento dos anestésicos locais em crianças difere do comportamento nos adultos, sendo o tempo de ação mais rápido, fato observado em nosso trabalho, com latência em torno de 2,29 minutos. Também concordamos que a duração de ação é mais curta, principalmente na anestesia cirúrgica. Entretanto, avaliamos a analgesia residual que ficou em torno de 4h13 minutos. Da mesma forma o bloqueio motor desapareceu rapidamente. Admitimos que houve uma falha no trabalho, pois não avaliamos o tempo da cirurgia, mas todos os procedimentos foram realizados com a anestesia proporcionada pela raquianestesia com sedação inalatória com sevoflurano.
Em nosso trabalho não utilizamos o termo taxa de sucesso, porém relatamos a ocorrência de duas falhas e nossa opção por anestesia geral, no lugar de punção adicional. Desta forma, o sucesso de 95% foi semelhante a diversos trabalhos citados por Silva Junior. Quanto ao questionamento pertinente em relação à sedação suplementar, foi omitido em nosso trabalho, que após a realização da raquianestesia e pesquisa de latência, nível sensitivo e bloqueio motor, foi reintroduzido o agente inalatório sevoflurano sob máscara facial e mantida a hipnose com concentração de 0,5%. Vale salientar que não fez parte do protocolo, mas houve uma economia de 40 a 60% do custo da anestesia. Este fato é de extrema importância num país como o Brasil.
O capítulo Raquianestesia em Pediatria de meu livro foi escrito por um dos mais conceituados anestesiologistas pediátricos do Brasil, que infelizmente não tem trabalho publicado sobre raquianestesia. Desta forma, o livro mostra a opinião do autor 20. Certamente, se for reeditado ele poderá reescrever o capítulo citando as novas indicações através de referência brasileira. A verdade tampouco tem história. As coisas são verdadeiras em seu detalhe, se consideradas uma a uma, mas duvidosas em seu conjunto, se consideradas no geral. Da mesma forma, verdades científicas, por mais evidentes e corretas que pareçam em um dado momento, esvaem-se rapidamente frente a novos conceitos e teorias ou novas evidências que modificam seus princípios 21.
Finalizando, não há verdade científica; há tão somente conhecimentos científicos, que são todos relativos e históricos 21. Infelizmente não podemos discutir nosso trabalho com a experiência pessoal de Silva Junior, já que ela não está publicada e, portanto não é de domínio público. Espero que num futuro próximo, Silva Junior, que formou uma geração de anestesiologistas pediátricos, possa publicar sua experiência pessoal para contribuir com o desenvolvimento da raquianestesia pediátrica no Brasil.