Correção endovascular do aneurisma da aorta abdominal: vazamento tipo 2 e o risco de rotura
Endovascular abdominal aortic aneurysm repair: type 2 endoleaks and risk of rupture
Fausto Miranda Jr.
O advento da correção endovascular do aneurisma da aorta abdominal trouxe uma nova morbilidade denominada vazamento (ou escape sanguíneo), pressurizando o saco aneurismático. Com isso, o risco da tão temida rotura do aneurisma persiste, sendo que esta não ocorre igualmente entre os diferentes tipos de vazamento1. Tem sido recomendado que os vazamentos tipo 1 e 3 sejam corrigidos prontamente; porém, quanto à conduta no tipo 2, persiste o debate entre a intervenção e o seguimento clínico do mesmo.
Este debate não é recente. Em uma conferência de especialistas na área, concluiu-se que o vazamento tipo 2 pode ocorrer entre 10 e 25% das correções endovasculares do aneurisma da aorta abdominal. Entre 30 e 100% dos casos, oclui-se espontaneamente, sem efeitos adversos na evolução. Quando, porém, ocorre crescimento do aneurisma após EVAR (correção endovascular), é mandatória a intervenção cirúrgica ou endovascular2.
Em revisão sistemática, incluindo-se 61 entre 606 trabalhos, avaliaram-se a eficácia e a segurança do reparo endovascular eletivo do aneurisma da aorta infrarrenal (AAA), em 19.804 casos. O vazamento tipo 2 foi o mais comum, ocorrendo em 14% dos casos, no primeiro mês, e decrescendo espontaneamente para 10,3%, em até 12 meses3.
Na experiência da Cleveland Clinic, durante um período de oito anos, entre outubro de 1999 e dezembro de 2007, entre 1.606 EVAR, ocorreram nove (0,52%) casos de vazamento tipo 24. Em nossa experiência, tratando 105 casos consecutivos de AAA, com um único tipo de endoprótese, entre março de 1997 e julho de 2003, observamos a ocorrência de quatro (3,8%) casos de vazamento tipo 25.
No acompanhamento de 873 pacientes submetidos à EVAR por AAA, observaram-se 164 (18,9%) casos de vazamento tipo 2. Evoluíram para completa resolução, em menos de seis meses, 131 casos (79,9%), não tendo ocorrido nenhum evento adverso neste período. Para os que persistiram por período superior a seis meses, ocorreram quatro roturas do aneurisma em um tempo médio de 31,6 meses, sugerindo que deve ser intensificada a vigilância ou atuar-se mais agressivamente6.
No acompanhamento de 486 pacientes consecutivos submetidos à EVAR para AAA, utilizando-se a tomografia computadorizada, foram analisadas a presença de vazamento tipo 2 e a ocorrência de crescimento do saco aneurismático maior que 5 mm. Em 90 (18,5%) pacientes, foi detectado o vazamento tipo 2. No seguimento médio de 21,7±16 meses, somente 35 (7,2%) pacientes mantiveram o vazamento tipo 2 por mais de seis meses. O crescimento do saco aneurismático foi observado em cinco pacientes, representando 1% de toda a série. Após o tratamento, não houve recorrência do crescimento do aneurisma em seguimento de 18,2±8 meses. Não houve ocorrência de rotura do aneurisma durante o seguimento do vazamento tipo 2, tanto nos tratados quanto nos não tratados7.
Entre os achados da tomografia computadorizada na avaliação pré-operatória do AAA, a presença de trombo mural circunferencial parece ser um fator protetor contra a presença do vazamento tipo 28. Na mesma linha de observação, em estudo retrospectivo da tomografia pré-operatória em 326 pacientes, foram analisados o diâmetro do aneurisma, a presença do trombo mural e a perviedade da artéria mesentérica inferior e das artérias lombares. A análise univariada demonstrou que a perviedade de todas as artérias lombares é um significativo preditor do vazamento tipo 2. Por outro lado, a análise multivariada demonstrou que a oclusão da artéria mesentérica inferior ou a oclusão do par de artérias lombares em nível de L3 ou em nível de L4, é um fator protetor independente contra o vazamento tipo 29.
No seguimento de 108 pacientes durante 24 meses, após embolização da artéria mesentérica inferior antes do EVAR para AAA, foi observada a diminuição do crescimento do saco aneurismático e da ocorrência de vazamento tipo 210. Contra a embolização rotineira pré-operatória da artéria mesentérica inferior, há o risco da isquemia intestinal. A recomendação é que somente o tronco da artéria mesentérica inferior seja embolizado, sendo deixadas livres a artéria cólica esquerda e a artéria retal superior11. Quanto à embolização pré-operatória das artérias lombares, esta costuma ser mais demorada, tecnicamente mais difícil e com maior ocorrência de falhas técnicas. Por estes motivos, tal intervenção não é realizada pela maioria dos especialistas12.
O resultado da avaliação do espectro de velocidade de fluxo pela ultrassonografia Doppler do vazamento tipo 2 pode ser preditivo de selamento espontâneo. Em seguimento de 265 pacientes submetidos à EVAR para AAA, foram avaliados 14 pacientes que, sem intervenção, tiveram selamento do vazamento tipo 2 em até seis meses. Outros 16 pacientes tiveram o vazamento persistente além deste período. A velocidade foi menor no grupo com selamento em tempo inferior a 6 meses (75,5±78,8 cm/s versus 138±36,2 cm/s; p<0,01). Os pacientes com vazamento selado e baixa velocidade (<100 cm/s) tinham menor ocorrência de artéria mesentérica inferior pérvia (43% versus 81%; p<0,01), diâmetro menor da artéria mesentérica inferior (5,6± 1,8 mm versus 7,2±1,3 mm; p<0,01) e menor número de pares de lombares (1,3±0,8 versus 2,4±0,6; p<0,0001), quando comparados com o grupo com vazamento persistente e velocidade intrassaco maior que 100 cm/s. Estes dados sugerem que a alta velocidade no vazamento tipo 2 está relacionada com o número e o diâmetro aumentado dos ramos na avaliação pré-operatória13.
Considerando-se a presença de fatores preditivos para ocorrência de vazamento tipo 2, foram analisados 195 pacientes pela tomografia computadorizada. Foi observado vazamento tipo 2 em 28 (13,4%) pacientes. Em dez pacientes, estavam presentes, em média, 4,3 artérias lombares pérvias, que tinham diâmetro menor de 2 mm (média 1,5 mm). Nos demais 18 pacientes, o diâmetro médio das artérias lombares era de 2,7 mm. Não foi observada significante correlação entre o diâmetro ou a perviedade da artéria mesentérica inferior e o desenvolvimento do vazamento tipo 2. Porém, a presença de quatro lombares pérvias (p<0,001) e pelo menos de uma artéria ilíaca interna pérvia (p<0,001) foram fatores preditivos. O mesmo foi observado para pelo menos uma artéria lombar pérvia com diâmetro maior de 2 mm (p<0,001)14.
Em que pese à controvérsia entre condutas, intervir ou acompanhar o vazamento tipo 2, temos adotado a seguinte conduta no seguimento do EVAR para AAA: tomografia computadorizada em até um mês de pós-operatório e, posteriormente, de acordo com o resultado da mesma, exame de ultrassonografia da aorta e das ilíacas a cada seis ou 12 meses, por laboratório agregado ao serviço. Este controle visa a acompanhar o diâmetro do aneurisma e a detecção de vazamento. Em caso de vazamento tipo 2, dependendo do achado ultrassonográfico, a repetição se dará com dois ou três meses de intervalo, com a finalidade de detectar o possível crescimento do aneurisma.
Abstract
The advent of endovascular aneurysm repair (EVAR) for aneurysms of the abdominal aorta (AAA) has brought with it a novel morbidity. The complication is known as endoleakage, in which escaped blood causes pressurization of the aneurysm sac. This means that a risk remains of a much dreaded ruptured aneurysm, although the degree of risk is not uniform across all different types of endoleak.1 It has been recommended that types 1 and 3 endoleaks should be repaired promptly; but there is still an ongoing debate on whether the ideal management for type 2 endoleaks is intervention or clinical follow-up.
This debate is not a recent phenomenon. At one conference of specialists on the subject, it was concluded that type 2 endoleaks can occur in 10 to 25% of endovascular repairs of abdominal aortic aneurysms. In from 30 to 100% of these cases, the leak will occlude spontaneously, without adversely affecting clinical progress. However, when there is growth of the aneurysm after EVAR, surgical or endovascular intervention is mandatory.2
A systematic review that selected 61 out of 606 studies assessed the efficacy and safety of 19,804 cases of elective endovascular repair for aneurysms of the infrarenal aorta. Type 2 endoleaks were the most common, occurring in 14% of cases within 1 month and decreasing spontaneously to 10.3% within 12 months.3
A retrospective analysis of the Cleveland Clinic's experience over an 8-year period from October 1999 to December 2007 showed that there were just nine (0.52%) cases of type 2 endoleak after a total of 1,606 EVARs.4 During our experience treating 105 consecutive AAA cases using a single type of endoprosthesis from March 1997 to July 2003, we have observed four (3.8%) cases of type 2 endoleak.5
Analysis of a series of 873 patients who underwent EVAR for AAA identified 164 (18.9%) cases of type 2 endoleak. Of these, 131 cases (79.9%) had resolved fully within 6 months, and no adverse events had occurred during the same time frame. Among those that remained beyond 6 months, there were four cases of aneurysm rupture after a mean interval of 31.6 months, suggesting either that monitoring should be more intensive or that more aggressive interventions should be employed.6
Computed tomography was used to investigate a sample of 486 consecutive EVAR-AAA patients for the presence of type 2 endoleaks and growth of the aneurysm sac exceeding 5 mm. Type 2 endoleaks were detected in 90 (18.5%) of these patients. Over a mean follow-up of 21.7±16 months, just 35 (7.2%) patients had type 2 endoleaks persisting for more than 6 months. Aneurysm sac growth was observed in five patients, accounting for 1% of the whole series. After treatment, there was no relapse to renewed aneurysm growth over 18.2±8 months' follow-up. None of the aneurysms ruptured during follow-up of type 2 endoleaks, irrespective of whether treated or not.7
Preoperative EVAR computed tomography findings of circumferential mural thrombus appear to be a protective factor against type 2 endoleaks.8 Along the same lines, a retrospective study of preoperative tomographs from 326 patients analyzed diameter of aneurysm, presence of mural thrombus and patency of the inferior mesenteric artery and the lumbar arteries. Univariate analysis showed that patency of all lumbar arteries was a significant predictor of type 2 endoleak. On the other hand, the multivariate analysis showed that occlusion of the inferior mesenteric artery or occlusion of the pair of lumbar arteries at the L3 or L4 level is an independent protective factor against type 2 endoleaks.9
A 24-month follow-up study of 108 patients who had undergone embolization of the inferior mesenteric artery before EVAR for AAA reported reductions in the rate of aneurysm sac growth and in type 2 endoleaks.10 One argument against routine preoperative embolization of the inferior mesenteric artery is the risk of intestinal ischemia. The recommendation is that only the trunk of the inferior mesenteric artery should be embolized, leaving the left colic artery and the superior rectal artery untouched.11 In turn, preoperative embolization of the lumbar arteries tends to be a more protracted and technically more difficult procedure with a higher rate of technical failures and, for these reasons, the majority of specialists do not attempt this intervention.12
Doppler ultrasonography assessment of the flow velocity spectrum can be predictive of spontaneous occlusion of type 2 endoleaks. A follow-up study of 265 patients who underwent EVAR for AAA identified 14 patients whose type 2 endoleaks had sealed with no intervention within 6 months. A further 16 patients had endoleaks that persisted beyond 6 months. Flow velocities were lower in the group with endoleaks that sealed in less than 6 months (75.5±78.8 cm/s vs. 138±36.2 cm/s; p<0.01). Patients with endoleaks that sealed and low flow velocities (<100 cm/s) had a lower proportion of patent inferior mesenteric arteries (43% vs. 81%; p<0.01), a smaller diameter inferior mesenteric artery (5.6±1.8 mm vs. 7.2±1.3 mm; p<0.01) and a lower number of paired lumbar arteries (1.3±0.8 vs. 2.4±0.6; p<0.0001), when compared with the group with persistent endoleaks and intra-sac velocities higher than 100 cm/s. These data suggest that higher velocity type 2 endoleaks are related to the higher numbers and larger diameters of branches found during preoperative assessments.13
A study that analyzed a series of 195 patients for the presence of factors predictive of the occurrence of type 2 endoleaks using computed tomography observed type 2 endoleaks in 28 (13.4%) patients. In ten of these patients there were a mean of 4.3 patent lumbar arteries, with diameters smaller than 2 mm (mean of 1.5 mm). In the other 18 patients, the mean diameter of the lumbar arteries was 2.7 mm. No significant correlation was observed between diameter or patency of the inferior mesenteric artery and development of type 2 endoleak. However, the presence of four patent lumbar arteries (p<0.001) or at least one patent internal iliac artery (p<0.001) were predictive factors. The same was true of at least one patent lumbar artery with a diameter greater than 2 mm (p<0.001).14
With regard to the debate over whether to intervene or monitor in type 2 endoleak cases, we have adopted the following conduct for monitoring patients after EVAR for AAA: a computed tomography examination is conducted within 1 month of the procedure and, depending on the result, an ultrasonography examination of the aorta and iliac arteries will be conducted every 6 or 12 months, by a laboratory affiliated to our service. These control examinations are intended to monitor the aneurysm diameter and detect any endoleaks. In cases of type 2 endoleaks, depending on ultrasonographic findings, examinations will be repeated at 2 or 3-month intervals in order to detect any growth in the aneurysm sac.
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